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Divórcio – Nova lei facilita e acelera processos, mas deixa margem para interpretações diversas

As mudanças legais vão ao encontro de uma visão mais liberal quanto à liberdade de decisão dos cônjuges e de uma concepção paternalista em relação ao papel do Judiciário

Um dos ramos do direito que mais sofreram alterações nos últimos anos foi, sem dúvida, o do direito de família.

Entre as novidades recentes mais relevantes nessa área, podemos citar a promulgação da lei que instituiu a guarda compartilhada de filhos (Lei nº 11.698/2008), a nova lei que dispõe sobre a alienação parental (Lei 12.318/2010), a equiparação da união estável ao casamento, o avanço da jurisprudência ao reconhecer direitos às relações homoafetivas e a indenização por abandono afetivo dos filhos. E, de maneira geral, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, o direito de família tornou-se menos patrimonializado, patriarcal e hierarquizado, atendendo aos anseios e avanços da sociedade.

A família atual – assim como o direito que dela trata – tornou-se plural, solidária, igualitária, e hedonista. Pauta-se, portanto, pela busca de uma vida feliz e de condições para o melhor desenvolvimento de seus integrantes, norteada por valores coletivos e individuais. A organização familiar não é mais vista pela ótica das relações de poder e dominação, mas sim como baseada em laços afetivos entre pessoas portadoras de direitos similares, o que significa dar atenção às necessidades não apenas materiais, mas também existenciais de todos os seus membros.

Em face dessa realidade, os operadores do direito, bem como toda a sociedade civil, estão diante, provavelmente, da maior inovação no direito de família dos últimos tempos: o desaparecimento do instituto da separação.

A Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, ao alterar a redação do art. 226, parágrafo 6º, da Constituição Federal, eliminou a separação do ordenamento jurídico, acabou com os prazos para concessão do divórcio e, segundo alguns, afastou definitivamente a possibilidade de discutir a culpa dos cônjuges pela falência do casamento, em respeito à autonomia da vontade dos cônjuges e atendendo ao princípio da liberdade e economia processual.

Separação e culpa

Para melhor compreensão da profundidade da mudança legislativa, é necessário esclarecer, brevemente, como era o regime da separação e divórcio no direito brasileiro.

A separação poderia ser judicial ou extrajudicial (esta última forma era reservada aos casais que haviam chegado a um acordo, sem filhos menores). Em qualquer caso, a separação fazia cessar apenas os deveres do casamento, como a coabitação, a fidelidade e o regime de bens.

Quando a separação não era requerida consensualmente pelos cônjuges, restava a possibilidade para qualquer deles de promover a separação, mas “imputando ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum”, ou “provar a ruptura da vida em comum há mais de um ano e a impossibilidade de sua reconstituição” (art. 1.572, Código Civil). Tais hipóteses consistiam nas chamadas “separação litigiosa” (com fundamento no adultério, sevícia, abandono, conduta desonrosa ou outros fatos que impossibilitassem a vida comum) ou “separação ruptura”.

Com o tempo, a obrigatoriedade da indicação das causas culposas do fim do casamento e investigação da culpa dos cônjuges passou a ser considerada, pela doutrina e jurisprudência, dispensável para decretação da separação.

A apuração da culpa, entretanto, continuou sendo relevante na discussão da obrigação alimentar entre os cônjuges e do direito ao uso do nome do outro consorte. Isso porque, caso o cônjuge culpado necessitasse de alimentos e não possuísse parentes em condições de prestá-los, receberia pensão alimentícia do cônjuge inocente, mas limitada ao mínimo indispensável à sobrevivência (art. 1704, Código Civil). Em outras palavras, o reconhecimento da culpa do cônjuge reduzia seu direito a recebimento de pensão alimentícia. Além disso, o cônjuge culpado perdia o direito a usar o sobrenome do outro (exceção feita às hipóteses de prejuízo para a identificação da pessoa).

A jurisprudência também já vinha reconhecendo, em determinadas hipóteses mais graves, a possibilidade de condenação do cônjuge culpado no pagamento de determinado valor, a título de indenização por danos morais a favor do cônjuge inocente.

Em decorrência disso, os fóruns estão repletos de separações litigiosas, nas quais o Estado tutela a discussão da culpa dos cônjuges pelo fim do casamento, para ao final declarar o culpado, com as consequências acima referidas nas mais diversas esferas, fazendo cessar os efeitos do vínculo conjugal, mas sem rompê-lo, o que só pode ser feito por meio do divórcio, o único instrumento formal que libera os cônjuges para constituir novo casamento.

Para que o divórcio fosse decretado, a lei exigia o transcurso mínimo de um ano a contar da separação judicial ou extrajudicial, ou a comprovação da separação de fato dos cônjuges por no mínimo dois anos. Nos termos do art. 226, parágrafo 6º, da Constituição Federal: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos”.

Por razões históricas, a lei anterior previa esse regime dualista para romper o vínculo do casamento (separação e divórcio), o que implicava duplo desgaste emocional para os cônjuges, além de mais custos.

Vale lembrar que até 1977 o casamento era indissolúvel, uma vez que a única forma legal de separação até então em vigor, o desquite, não rompia o casamento, mas apenas seus efeitos. Para que a Lei do Divórcio fosse aprovada no Congresso Nacional naquele ano, foi necessário manter o antigo desquite, então alcunhado de separação, dando origem a um sistema binário de dissolução da sociedade conjugal, que só foi alterado agora, com a Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010.

O divórcio hoje

A atual redação do art. 226, parágrafo 6º, da Constituição Federal diz simplesmente que “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”.

Como a nova lei não dispõe mais sobre prazos para decretação do divórcio nem faz menção à separação, a doutrina se divide quanto a seu alcance e efeitos, valendo apontar as seguintes correntes e suas interpretações:

  • Corrente ampliativa: a lei tem aplicação imediata; o divórcio não necessita de requisitos de ordem subjetiva (indicação de motivos) ou objetiva (cumprimento de prazos); o instituto da separação foi eliminado por não ter mais amparo constitucional, assim como todos os dispositivos infraconstitucionais que dela tratavam; não é mais possível a discussão da culpa pela falência do casamento, sequer para repercussão no dever alimentar e nome. Em relação aos alimentos, serão fixados levando-se em consideração a necessidade de quem recebe e possibilidades de quem paga. Serão, no entanto, fixados no indispensável à sobrevivência quando o estado de necessidade decorrer da culpa de quem os pleiteia, sendo a prodigalidade a hipótese clássica deste tipo;
  • Corrente restritiva: a abolição de prazos para concessão do divórcio dependerá de alteração na legislação inferior; a separação não foi abolida, assim como a possibilidade de discussão de culpa.
  • Corrente intermediária: a lei tem aplicação imediata, o divórcio não está sujeito a qualquer prazo; a separação foi abolida, mas a discussão da culpa pode ocorrer após a decretação do divórcio, diante da repercussão na obrigação alimentar, nome e indenização. O divórcio pode ser decretado de imediato, mas aos interessados será permitido discutir e buscar o reconhecimento da culpa pelo fim do casamento para reduzir o encargo alimentar, impor indenização por danos morais e restringir o uso do nome, não havendo ainda consenso se nos próprios autos do divórcio ou em ações autônomas.

No caso de ação de separação judicial em andamento, a mudança legal permite que, se ambos os cônjuges estiverem de acordo, haja a decretação do divórcio. Se não houver acordo quanto ao divórcio, o juiz poderá – caso entenda não haver mais separação no direito brasileiro – extinguir a ação e decretar o divórcio, decisão que obriga o magistrado a posicionar-se quanto à possibilidade de seguimento da discussão da culpa para as questões conexas.

Em qualquer hipótese, poderá haver recurso ao Tribunal de Justiça, que terá a missão de pacificar a matéria.

A “medida cautelar de separação de corpos” continua válida para formalizar a separação de fato do casal, fazendo cessar a coabitação, o dever de fidelidade e o regime de bens (o que for adquirido por um dos cônjuges passa a ser incomunicável ao outro, independentemente do regime de bens), e visando também afastar um dos cônjuges do lar, diante de eventual risco à integridade do outro e de eventuais filhos, ou, à luz da interpretação segundo a qual persiste a possibilidade de apuração da culpa pelo divórcio, evitar o abandono de lar.

A partilha de bens adquiridos no casamento pode ser feita após a decretação do divórcio, apesar de ser recomendável realizá-la no próprio processo de divórcio.

De forma geral, portanto, constatamos que as profundas transformações na legislação do divórcio vão ao encontro de uma visão mais liberal quanto à liberdade de decisão dos cônjuges e são menos paternalista em relação ao papel do Judiciário, propiciando maior facilidade e celeridade aos processos.

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